No portal do Museu da Língua Portuguesa, há uma importante coletânea de textos que podem interessar aos que amam o idioma e querem usá-lo com maior discernimento. Como exemplo, queiram conhecer Uma política linguística para o português, de Ataliba T. Castilho.
Na apresentação do texto, diz-se que “política costuma ser um tema ligado a partidos, deputados e ministros; no entanto, a linguística possui sua própria política, bem diferente daquela conhecida em Brasília” (referência feita à Capital do Brasil).
Na sua exposição, o autor se propõe a fazer uma definição do que seja ‘política linguística’. A proposta de definição inicia-se com as seguintes perguntas:
- O que é política linguística?
- Qual é a dimensão internacional da Língua Portuguesa?
- Como tem sido a documentação e o estudo da Língua Portuguesa no Brasil, em Portugal e na África?
- Que ações governamentais são tomadas com respeito à língua portuguesa?
- Que tem feito o Estado brasileiro com respeito ao ensino da Língua Portuguesa?
- Como são tratadas as minorias linguísticas?
- Quais são as relações entre o português e o espanhol na América Latina?
Depois de esboçar suas primeiras respostas, Ataliba T. Castilho aprofunda uma série de questões sobre:
- A língua oficial do Estado e sua gestão
- Gestão das comunidades bilíngues e plurilíngues
- Gestão das minorias linguísticas
- O Estado e o ensino da Língua Portuguesa como língua materna
- A atuação das universidades nas questões do ensino do Português
- O Estado e o ensino das línguas estrangeiras
Seu texto, arguto e bem informado, pretende ser um convite ao debate, conquanto nele defenda de forma vigorosa seus pontos de vista como no seguinte seguimento (adaptado à nova ortografia):
Cinco países africanos escolheram o português como sua língua oficial, depois das guerras de independência: Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe. Mais recentemente, Timor Leste somou-se a esse grupo, como a mais nova nação democrática do mundo. Nova e heroica, pois resistiu à Indonésia e à Austrália ao adotar o Português como sua língua oficial.
Organismos internacionais adiante mencionados têm debatido algumas políticas comuns que poderiam ser estabelecidas para os países de língua oficial portuguesa, respeitadas as diferenças regionais.
Relativamente à identificação do padrão linguístico, simplificando bastante as coisas, pode-se reconhecer que passamos no Brasil por duas fases.
Até a primeira metade do século passado, moções aprovadas em congressos apontaram uma variedade regional, o falar carioca, como o padrão do Português Brasileiro. Essa variedade passou a ser utilizada na preparação de livros didáticos por professores do Rio de Janeiro, impressos por editoras localizadas em sua maioria na mesma cidade. Não deu certo, pois a ideia não contava com fundamento empírico. Nunca se comprovou que as classes cultas brasileiras falavam como seus homólogos cariocas, nem que passassem a falar como tal. Aprendeu-se que em matéria de política linguística uma legislação mesmo que informal não molda a realidade.
Com o desenvolvimento da pesquisa linguística, surgiram a partir dos anos 70 projetos coletivos de descrição da variedade brasileira do Português. Ao descrever a realidade dos usos linguísticos cuidadosamente documentados, confirmou-se a hipótese de Nelson Rossi sobre o policentrismo do padrão linguístico, nucleado no Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul: Rossi (1968). Surgiram aí padrões marcados por escolhas fonéticas e léxicas que se não complicam a intercomunicação, pelo menos não escondem os diferentes modos de falar dos brasileiros cultos, objeto de consideração nas escolas.
Impossível, em suma, escolher uma variedade regional e considerá-la o padrão do Português Brasileiro. Impossível, também, comprovar que esse padrão esteja documentado na língua literária. Há um padrão da língua falada, que corresponde aos usos linguísticos das pessoas cultas. Há um padrão da língua escrita, que corresponde aos usos linguísticos dos jornais e revistas de grande circulação, os únicos textos que garantidamente estão ao alcance da população. Ambos os padrões apresentam as variações linguísticas comuns às sociedades complexas.
Já a língua literária é outra coisa, pois assenta num projeto estético que impulsiona os autores a, justamente, distanciar-se da escrita do dia-a-dia, buscando um veio próprio, singular, diferenciado, não-padrão. Sempre achei um desrespeito tratar os grandes escritores como meros fornecedores de regras de bom Português para uso das escolas. Como diríamos coloquialmente, os escritores “estão em outra”, para sorte de seus leitores.
De todo modo, a atitude brasileira tem sido mais equilibrada do que a de nossos vizinhos hispano-americanos, em matéria de seleção do chamado “uso bom”. Lembre-se que em 1870 a Real Academia de la Lengua Española propôs às suas antigas colônias da América a organização de academias correspondentes, para centralizar a “legislação linguística”, vale dizer, o direito de legitimar o “bom espanhol”. É embaraçoso constatar que, com maior ou menor velocidade, os países hispano-americanos aderiram a essa proposta: a Colômbia em 1871, o Equador em 1874, o México em 1875, a Venezuela em 1884, o Chile em 1886, o Peru em 1887, a Guatemala em 1888 e a Argentina em 1931: Calvet (2001). Verdade, também, que novas tendências iluminam hoje os linguistas hispano-americanos, cuja agenda ultrapassou felizmente os propósitos então unificadores da RAE.
Após oferecer suas conclusões, o estudioso elenca alguns tópicos para que os aprofundemos, seja a partir de sua ótica, seja buscando outras óticas, seja considerando cada tema crucial de acordo com a nossa ótica caso já a tenhamos alcançado:
- O que é padrão linguístico, ou norma culta
- Quem determina qual é a melhor forma de escrever e falar em português?
- É verdade que em determinadas regiões se fala português melhor que em outras?”
- O que é uma minoria linguística?
- Há minorias linguísticas no Brasil?
- Que rumos o ensino do português tem tomado no que diz respeito à alfabetização, leitura, redação e gramática?
O texto está disponível para download e ser lido na íntegra nesta página:
http://www.museudalinguaportuguesa.org.br/colunas_interna.php?id_coluna=17
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